quarta-feira, 1 de julho de 2009
Vice-versa de julho
Dois escritores que residem em Porto Alegre trocam ideias sobre o fazer literário. Christian David iniciou sua ´carreira literária com financiamento do Fumproarte e, com seu segundo título, Mão dupla, integra o catálogo de Bolonha. Jacira Fagundes, além de ter dois títulos publicados para crianças, publica para adultos e ministra oficinas de criação literária.
Christian pergunta. Jacira responde.
Christian David - Tens algum ritual para começar a escrever? Algum local exclusivo, hora do dia, roupa especial?
Jacira Fagundes - Não costumo me prender a um ritual. Isto depende muito do meu tempo relacionado às demais atividades. Mas geralmente escrevo à tarde e à noite, diretamente no computador. Na maioria das vezes acompanhada por uma água ou cafezinho e sala silenciosa, não aprecio quaiquer ruídos, sequer música, quando escrevo.
CD - Escrever para ti é uma decisão ou uma compulsão? Problema ou solução? Trabalho ou diversão?
JF - Já foi uma compulsão mal direcionada, hoje é uma decisão bem assumida. O ato de escrever, encaro como atividade decorrente do meu trabalho de escritora. Como escrevo, além da literatura infanto-juvenil, contos e novelas direcionados ao leitor em geral, e ainda textos para jornal cultural, estou sempre envolvida em escrita. Escrevo diariamente, mas também me divirto muito, principalmente com textos para crianças.
CD - Utilizas muito da tua vivência de criança e adolescente nos textos ou partes mais da observação das crianças e jovens de hoje?
JF - Em geral vou compondo ao longo do tempo e registrando aqui e ali, experiências infantis vividas na casa paterna e na casa da minha avó, principalmente. Não as uso integralmente; é um porão da avó que aparece no ambiente, ou uma fala do pai que coloco no personagem, nada além disto, ou o gosto de uma comida feita pela minha mãe. Valho-me bem mais da observação das crianças de hoje, das histórias reais que surgem na imprensa, dos personagens de outros autores que leio. Mas o meu imaginário sempre abre novas possibilidades para as cenas reais.
CD - E o que a Jacira leitora busca na leitura de um livro infantil ou juvenil? O que mais te chama a atenção?
JF - O inusitado, a exploração do imaginário, o texto envolvente, o novo olhar que o autor se permite e me permite como leitora.
CD - Qual teu próximo projeto?
JF - Estou com um livro de contos no prelo intitulado No limite dos sentidos saindo talvez para agosto. São 22 contos para o leitor adulto. Para o leitor infanto-juvenil estou escrevendo uma pequena novela que se chamará Mania de Gavetas, sobre uma menina que tem uma compulsão por bisbilhotar gavetas alheias. No projeto, estou entrevistando pré-adolescentes e me surpreendendo com os possíveis e incríveis objetos que residem nas gavetas dos guardados dos pequenos.
Jacira pergunta. Christian responde.
Jacira Fagundes - O que te levou à preferência na tua criação literária por obras direcionadas ao público infanto-juvenil? Que tipo de leitura te serviu de experiência?
Christian David - A preferência saiu meio ao natural, não pensava em escrever especificamente para jovens, mas, durante o processo de criação, o texto acabava ficando com aquele "jeitão" de texto juvenil, coisa boa de acontecer, gosto de escrever pra esse público.
Li todas as possibilidades de gibis quando era adolescente, além de muito livro de ficção-científica. Acho que essas leituras moldaram um pouco o que escrevo hoje. Mas, por ser um adolescente um tanto tímido, a questão da angústia adolescente também aparece, e bastante, nos meus textos.
JF - Como te ocorreu a ideia pela primeira vez? Como foi a decisão por um tema? Quais foram tuas apreensões na época?
CD - Comecei escrevendo sem grandes pretensões, não pensava em ser escritor. Só comecei a levar a sério quando recebi o financiamento do Fumproarte. Daí fiquei preocupado com que o produto final ficasse bom, e acho que dentro das minhas possibilidades e conhecimentos na época meu primeiro livro ficou bem bacana.
JF - Como tem sido atualmente? Tens algum tipo ou tema recorrente? O que chega primeiro - o tema ou os personagens? Ou ambos? Ou não dá para definir?
CD - Tenho mais idéias do que consigo colocar no papel, e isso, as vezes, é um problema. Escrevo sobre aquilo que me move, que me toca ou preocupa, ou, no caso das minhas aventuras fantásticas, sobre histórias que eu gostaria que existissem. Geralmente o que aparece primeiro é o personagem e sua vida interior, o resto vai se formando ao redor.
JF - Antes de compor a história constróis algum projeto em linha gerais? ou em detalhes? Ou a história vai se construindo na medida da criação do texto? Como é este processo? calmo? com horários previamente estabelecidos? conturbado?
CD - Não tenho um processo específico ou definido, anoto as idéias para não esquecê-las e quando começo a escrever já sei aonde quero chegar. As vezes dou uma travada no meio e o texto fica esquecido algumas semanas. O texto fica fermentando na minha cabeça até que entre em erupção e eu volte a escrever. Escrevo quando dá, quando tenho uma folga, quando acontece de eu estar na frente de um computador com tempo disponível. Meio angustiante mas sem chance de mudança por enquanto.
JF - Durante o processo de criação, com que sentimentos convives mais fortemente? Prazer, diversão, ansiedade, dor? Teus personagens costumam invadir teu tempo real além do ficcional? Como gerencias estes momentos?
CD - A angústia e a ansiedade estão presentes, mas, geralmente, antes de começar a escrever; quando coloco as palavras no papel me divirto de verdade. Acho que separo bem a ficção da realidade, mas alguns personagens teimam em soltar frases na minha cabeça durante o dia, nos mais variados momentos. Daí é hora de escrever.
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