Neste Vice-versa de novembro, contamos com as palavras de Maíra Suertegaray e Letícia Moller.
Maíra Suertegaray é professora de Geografia, escritora e contadora de histórias. Após desenvolver oficinas e materiais pedagógicos para o ensino de Geografia, a ideia de escrever para o público infantil despertou-a para o universo de LIJ.
Letícia Moller é advogada e escritora. Embora em meio a três irmãos, encontrou o tantinho de solidão de que precisava para criar seus mundos secretos. E para ler muito.
Ao gosto pela leitura logo se somou o gosto pela escrita. Hoje tem dois livros infantis publicados.
Uma e outra nos brindam com ricas experiências no campo da literatura infantil.
Letícia
pergunta. Maíra responde.
Letícia – Maíra, como surgiu o desejo de escrever para crianças?
Maíra – O desejo surgiu a partir de duas situações que se colocaram na
minha vida: ser mãe de uma menina pequena (4 anos) muito curiosa e dar
aula de Geografia para crianças do 6o ano do Ensino Fundamental no
Colégio de Aplicação da UFRGS. Dandara, minha filha, sempre fazia
muitas perguntas sobre as coisas que via no seu cotidiano,
principalmente sobre os fenômenos da natureza. Uma noite, quando eu a
colocava para dormir, estávamos lendo uma história em que uma menina
esticava muito os braços para alcançar o Sol. A partir desta cena
começamos a criar uma outra história. Eu perguntava, Dandara respondia,
e assim fomos indo. No dia seguinte, a história não saía da minha
cabeça, então resolvi colocá-la no papel.
Como professora de crianças menores (faixa etária 11-12 anos), buscava
novas formas de trabalhar Geografia, formas mais lúdicas, leituras mais
agradáveis com fantasia e ao mesmo tempo com conteúdo científico. Tive
muita dificuldade para encontrar materiais. Foi então que estes dois
caminhos se encontraram: estava ali, na minha frente, uma história
repleta de elementos geográficos. A história que havia escrito com as
contribuições da Dandara era uma possibilidade que se colocava para o
trabalho com os pequenos. A partir daí, minha cabeça começou a
fervilhar de ideias. Meus alunos fazem perguntas maravilhosas, também
são minha fonte de inspiração.
Letícia – Aqui em casa, “Dandara, o Dragão e a Lua” está entre os
preferidos do momento. De onde partiu a ideia para a história?
A tua formação em geografia teve influência na escolha do tema, ou
foi a Dandara que “determinou” a escolha? Como se deu o processo de
escrita do livro?
Maíra – “Dandara, o Dragão e a Lua” foi a história de que falei antes.
Surgiu de uma construção feita entre mãe, professora de Geografia e
filha, menina cheia de perguntas e curiosidades sobre o céu, o Sol, a
Lua, as nuvens, etc. Depois de escrito o texto base, fui lendo,
retrabalhando a história e inserindo curiosidades do meu tempo de
criança, perguntas feitas por mim e meus irmãos. Foi assim que nasceu a
história de “Dandara, o Dragão e a Lua”, narrativa que fala de uma
menina curiosa que adora o céu. Por ser muito atenta e observadora,
descobre muitas coisas mas também tem muitas perguntas... A partir
desta paixão, Dandara e seu dragão mágico partem para uma viagem pelo
espaço na busca de trazer a Lua e as estrelas pra seu quarto. Posso
dizer, então, que esta história tem um pouco dos dois: minha influência
enquanto professora, mas tem muito mais das curiosidades da Dandara.
Letícia – Compartilhamos a formação acadêmica e a escrita de
textos científicos. Por isso a minha curiosidade em saber como foi,
para ti, a migração da linguagem e da forma acadêmicas para o
universo da literatura e da escrita de narrativas para crianças. No
teu processo de escrita, a familiaridade com a linguagem
científica influenciou ou tentou intrometer-se na escrita
literária, ou elas estavam claramente separadas?
Maíra – Foi difícil no início, pois, a linguagem científica estava
muito arraigada nos meus textos. Mesmo tendo lido inúmeros livros
infantis e sabendo como eu gostaria que ficasse a história, meus textos
eram muito formais e isso me incomodava. Li e reli as versões,
conversei com outros autores, pedi que outras pessoas lessem o texto e
me dissessem suas impressões. Foram muitas releituras e muitas limpezas
do texto até ele ficar pronto. Aprendi a conversar com a ilustração do
texto, assim poderia suprimir algumas partes que apareceriam nos
desenhos. Também aprendi que nem tudo precisa ser dito, algumas ideias
podem ficar por conta da imaginação do leitor. Isso é fantástico, é
algo inimaginável na linguagem acadêmica, pelo menos na minha área de
conhecimento. Mas por outro lado, o conhecimento científico contribuiu
para que eu falasse sobre geografia de outro modo, sem erros
conceituais, infelizmente muito presentes em livros infantis quando se
trata de fenômenos da natureza. Aprendi muito neste processo e essas
aprendizagens me ajudaram nas histórias seguintes.
Letícia – Quais foram as leituras de infância que mais te
marcaram? Há algum autor ou obra que seja fonte de inspiração para a
tua escrita?
Maíra – Quando pequena, lembro dos livros da Eva Furnari, com aquela
bruxinha maravilhosa que aprontava horrores. Na pré-adolescência eu lia
muito, era uma das que mais retirava livros na biblioteca. Eu amava os
livros da Série Vagalume, principalmente aqueles de mistério escritos
pela Lúcia Machado de Almeida e pelo Marcos Rey. Havia também os livros
do Pedro Bandeira que narravam as aventuras dos Karas, eu adorava.
Para escrever as minhas histórias, pesquiso muito, tanto em materiais
de cunho científico, quanto em outros livros infantis. Leio livros que
tratam de temas parecidos, mas não tenho um autor específico.
Letícia –Tens projetos literários em andamento? Estão vindo
novos livros infantis por aí?
Maíra – Saiu do “forno” recentemente o livro Dandara e a Princesa
Perdida, editado pela Compasso Lugar-cultura em parceria com a Imprensa
Livre. Também escrito a partir de uma pergunta maravilhosa, mas
desconcertante da minha filha Dandara: Mãe, por que não existem
princesas negras?
Dandara, filha de pai negro e de mãe branca, é uma menina mestiça que
começou a questionar sobre aspectos ligados às suas origens e à sua
identidade. As histórias de princesas mais conhecidas são de matriz
europeia e trazem personagens de pele branca e cabelos claros e isso a
despertou para este questionamento. Esta pergunta não é parte somente
do mundo da Dandara, mas de muitas outras meninas e também de meninos
que querem conhecer princesas, príncipes e heróis negros. Nesta
história procurei trazer, além de informações sobre a África, elementos
presentes nos contos africanos, que recentemente chegam às nossas
prateleiras. Li muitos contos africanos, tive contato com autores
maravilhosos como Celso Cisto, Rogério Andrade Barbosa, Júlio Emílio
Braz. Estou adorando este universo.
Maíra – O desejo surgiu a partir de duas situações que se colocaram na
minha vida: ser mãe de uma menina pequena (4 anos) muito curiosa e dar
aula de Geografia para crianças do 6o ano do Ensino Fundamental no
Colégio de Aplicação da UFRGS. Dandara, minha filha, sempre fazia
muitas perguntas sobre as coisas que via no seu cotidiano,
principalmente sobre os fenômenos da natureza. Uma noite, quando eu a
colocava para dormir, estávamos lendo uma história em que uma menina
esticava muito os braços para alcançar o Sol. A partir desta cena
começamos a criar uma outra história. Eu perguntava, Dandara respondia,
e assim fomos indo. No dia seguinte, a história não saía da minha
cabeça, então resolvi colocá-la no papel.
Como professora de crianças menores (faixa etária 11-12 anos), buscava
novas formas de trabalhar Geografia, formas mais lúdicas, leituras mais
agradáveis com fantasia e ao mesmo tempo com conteúdo científico. Tive
muita dificuldade para encontrar materiais. Foi então que estes dois
caminhos se encontraram: estava ali, na minha frente, uma história
repleta de elementos geográficos. A história que havia escrito com as
contribuições da Dandara era uma possibilidade que se colocava para o
trabalho com os pequenos. A partir daí, minha cabeça começou a
fervilhar de ideias. Meus alunos fazem perguntas maravilhosas, também
são minha fonte de inspiração.
Letícia – Aqui em casa, “Dandara, o Dragão e a Lua” está entre os
preferidos do momento. De onde partiu a ideia para a história?
A tua formação em geografia teve influência na escolha do tema, ou
foi a Dandara que “determinou” a escolha? Como se deu o processo de
escrita do livro?
Maíra – “Dandara, o Dragão e a Lua” foi a história de que falei antes.
Surgiu de uma construção feita entre mãe, professora de Geografia e
filha, menina cheia de perguntas e curiosidades sobre o céu, o Sol, a
Lua, as nuvens, etc. Depois de escrito o texto base, fui lendo,
retrabalhando a história e inserindo curiosidades do meu tempo de
criança, perguntas feitas por mim e meus irmãos. Foi assim que nasceu a
história de “Dandara, o Dragão e a Lua”, narrativa que fala de uma
menina curiosa que adora o céu. Por ser muito atenta e observadora,
descobre muitas coisas mas também tem muitas perguntas... A partir
desta paixão, Dandara e seu dragão mágico partem para uma viagem pelo
espaço na busca de trazer a Lua e as estrelas pra seu quarto. Posso
dizer, então, que esta história tem um pouco dos dois: minha influência
enquanto professora, mas tem muito mais das curiosidades da Dandara.
Letícia – Compartilhamos a formação acadêmica e a escrita de
textos científicos. Por isso a minha curiosidade em saber como foi,
para ti, a migração da linguagem e da forma acadêmicas para o
universo da literatura e da escrita de narrativas para crianças. No
teu processo de escrita, a familiaridade com a linguagem
científica influenciou ou tentou intrometer-se na escrita
literária, ou elas estavam claramente separadas?
Maíra – Foi difícil no início, pois, a linguagem científica estava
muito arraigada nos meus textos. Mesmo tendo lido inúmeros livros
infantis e sabendo como eu gostaria que ficasse a história, meus textos
eram muito formais e isso me incomodava. Li e reli as versões,
conversei com outros autores, pedi que outras pessoas lessem o texto e
me dissessem suas impressões. Foram muitas releituras e muitas limpezas
do texto até ele ficar pronto. Aprendi a conversar com a ilustração do
texto, assim poderia suprimir algumas partes que apareceriam nos
desenhos. Também aprendi que nem tudo precisa ser dito, algumas ideias
podem ficar por conta da imaginação do leitor. Isso é fantástico, é
algo inimaginável na linguagem acadêmica, pelo menos na minha área de
conhecimento. Mas por outro lado, o conhecimento científico contribuiu
para que eu falasse sobre geografia de outro modo, sem erros
conceituais, infelizmente muito presentes em livros infantis quando se
trata de fenômenos da natureza. Aprendi muito neste processo e essas
aprendizagens me ajudaram nas histórias seguintes.
Letícia – Quais foram as leituras de infância que mais te
marcaram? Há algum autor ou obra que seja fonte de inspiração para a
tua escrita?
Maíra – Quando pequena, lembro dos livros da Eva Furnari, com aquela
bruxinha maravilhosa que aprontava horrores. Na pré-adolescência eu lia
muito, era uma das que mais retirava livros na biblioteca. Eu amava os
livros da Série Vagalume, principalmente aqueles de mistério escritos
pela Lúcia Machado de Almeida e pelo Marcos Rey. Havia também os livros
do Pedro Bandeira que narravam as aventuras dos Karas, eu adorava.
Para escrever as minhas histórias, pesquiso muito, tanto em materiais
de cunho científico, quanto em outros livros infantis. Leio livros que
tratam de temas parecidos, mas não tenho um autor específico.
Letícia –Tens projetos literários em andamento? Estão vindo
novos livros infantis por aí?
Maíra – Saiu do “forno” recentemente o livro Dandara e a Princesa
Perdida, editado pela Compasso Lugar-cultura em parceria com a Imprensa
Livre. Também escrito a partir de uma pergunta maravilhosa, mas
desconcertante da minha filha Dandara: Mãe, por que não existem
princesas negras?
Dandara, filha de pai negro e de mãe branca, é uma menina mestiça que
começou a questionar sobre aspectos ligados às suas origens e à sua
identidade. As histórias de princesas mais conhecidas são de matriz
europeia e trazem personagens de pele branca e cabelos claros e isso a
despertou para este questionamento. Esta pergunta não é parte somente
do mundo da Dandara, mas de muitas outras meninas e também de meninos
que querem conhecer princesas, príncipes e heróis negros. Nesta
história procurei trazer, além de informações sobre a África, elementos
presentes nos contos africanos, que recentemente chegam às nossas
prateleiras. Li muitos contos africanos, tive contato com autores
maravilhosos como Celso Cisto, Rogério Andrade Barbosa, Júlio Emílio
Braz. Estou adorando este universo.
Maíra pergunta. Letícia responde.
Maíra – Letícia, o que te levou a escrever para crianças?
Letícia – Ainda bem pequena, descobri minha paixão pelas palavras e pelas histórias. Meus pais eram grandes incentivadores da leitura. Creio que desse prazer que a leitura me proporcionava surgiu a vontade de inventar minhas próprias histórias. Com 7 anos fiz meus primeiros livrinhos, que elaborava amorosamente para presentear os parentes e amigas de escola. Já adulta, a literatura infantil continuou a ser uma paixão, e assim as primeiras narrativas que escrevi foram para crianças. Hoje também escrevo pequenas prosas, crônicas e poemas “adultos”.
Maíra – Como autora, tu participas de muitas feiras do livro, nas quais tens o contato direto com o público. Como trabalhas as tuas histórias com os pequenos leitores?
Letícia – O “Eu e você, aqui e lá!” permite diferentes abordagens, indo do tema da diversidade cultural e da tolerância entre os povos à reflexão mais próxima das crianças, as diferenças dentro da própria sala de aula e como lidar com elas. Costumo mostrar imagens do Marrocos e dos berberes, para aguçar a curiosidade dos pequenos e a vontade de conhecer hábitos e culturas distintos dos nossos.
O “Corre, Pedro, corre!” fala de um menino como tantos que vemos hoje, um pequeno executivo cumpridor de tarefas, sem tempo para brincar. Há uma crítica de fundo (e uma autocrítica) ao ritmo frenético que acabamos por impor aos nossos filhos desde cedo. Me surpreendi, ao visitar escolas em cidadezinhas pacatas, onde imaginei que as crianças não se identificariam com a rotina do Pedro. Mas de um modo ou de outro se identificam, muitas vezes porque fora do horário de escola devem ajudar os pais em casa ou no trabalho.
Maíra – O livro “Eu e Você, Aqui e Lá” trata de um tema bastante importante e atual que é o respeito às diferenças. Como surgiu a inspiração para escrever esta história?
Letícia – A questão da diversidade cultural, e mais especificamente os temas do pluralismo e do universalismo cultural, desde uma perspectiva da Filosofia do Direito, foram objeto de estudo durante meu doutorado na Itália. Então, era (e ainda é) um tema caro para mim, e que estava muito presente quando eu e meu marido viajamos ao Marrocos. Conheci alguns vilarejos berberes a caminho do deserto, onde conversei com as crianças e travei contato com aquela cultura. Assim nasceu a ideia para a história, unindo uma reflexão que eu fazia naquele período com a experiência concreta da viagem. No livro, o menino brasileiro sente um estranhamento inicial diante do menino berbere, que gradualmente dá lugar à percepção de que há também coisas em comum entre eles, gerando a empatia e a vontade de amizade.
Maíra – As ilustrações são parte essencial de um livro infantil. Como dialogas com o ilustrador durante a elaboração do livro?
Letícia – Meus dois livros infantis foram ilustrados pelo Gabriel Demarchi, com projeto gráfico do Gustavo Demarchi. Fiquei muito feliz com a nossa parceria, e quis que eles criassem em plena liberdade, sem intromissões minhas. Mas tive o prazer de poder acompanhar a criação das ilustrações e dialogar com eles durante o processo. Para o “Eu e você, aqui e lá!”, que aborda o Marrocos e os povos berberes, emprestei a eles um livrão de fotografias que adquiri durante viagem ao país, e que, segundo ambos, foi bem interessante para se familiarizar com aquele cenário.
Maíra – Tens algum projeto em andamento? Está saindo livro novo para a gurizada?
Letícia – Tenho alguma coisa pronta, e no momento estou finalizando uma história para crianças que aborda o tema da perda, da finitude e da memória. Foi uma história que custou a sair, a encontrar seu tom e forma, mas agora está quase pronta. Tenho alguns esboços para narrativas juvenis, às quais pretendo me dedicar no ano que vem.
2 comentários:
Maíra e Letícia, agradeço a colaboração de vocês ao nosso blog. São matérias desta importância que não só trazem visibilidade a nossos autores, como igualmente à associação que representa a cada um de nós, escritores e ilustradores de LIJ.
Muito obrigada.
Jacira Fagundes
Jacira,
eu que agradeço pelo convite! Foi um prazer dialogar com a Maíra e trocar ideias sobre o fazer literário para crianças.
Este é um espaço valioso para nós, autores de LIJ, e um estímulo extra para seguir sempre em frente e cada vez melhor.
Um forte abraço,
Letícia Möller.
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